No universo dos discos de vinil, as capas não são apenas embalagens, mas expressões artísticas que contam histórias. Elas são a primeira conexão visual que temos com a música e, muitas vezes, se tornam tão icônicas quanto as próprias canções. Neste artigo, mergulhamos na história do rock e exploramos quatro pares de capas de álbuns que compartilham uma semelhança notável, seja por homenagem, inspiração ou paródia.
As capas gêmeas eram mais comuns nos antigos tempos, onde a música ainda não era digital, e uma boa capa era a primeira impressão que o ouvinte tinha com a obra de um artista. Muitas vezes, era apenas a capa que fazia um colecionador decidir comprar ou não um disco.
Obviamente, o manuseio constante me levou perceber certos padrões em algumas destas estampas e fui atingido pela questão da existência do que podemos chamar de “capas gêmeas”. Capas gêmeas seriam capas de álbuns que se parecem por motivos diversos: homenagem, inspiração, paródia, etc..
Hoje, separei quatro pares que, sem dúvida, se encaixam nestes critérios acima especificados.
Elvis Presley e The Clash: Irmãos de Capa no Rock N’ Roll
O que o rei do rock n’ roll, Elvis Presley, tem em comum com uma das maiores bandas de rock da história, o The Clash? Bom, além da máxima relevância para a história da música moderna, podemos dizer que são “irmãos de capa”. O primeiro par que captura nossa atenção é o do rei do rock, Elvis Presley, e a lendária banda de punk rock, The Clash.
O ano era 1956 e Elvis Presley lançava seu primeiro disco, auto-intitulado, que era estampado por uma foto que esbanjava espírito roqueiro, com Elvis empunhado de modo visceral seu violão. A fotografia foi tirada durante uma performance de Elvis Presley em um programa de televisão gravado na cidade de Tama, na Flórida.
A seriedade dos tons cinzentos da fotografia original foi quebrada pelas letras garrafais, em rosa e verde, trazendo o nome do mais novo astro da música pop. O modelo apresentado no debut do rock n’ roll foi copiado inúmeras vezes, mas o sucesso foi repetido em raríssimas dessas ocasiões.
Com certeza, a versão futura de maior impacto foi a apresentada no álbum London Calling, do quarteto britânico The Clash. Como poucas vezes a coincidência pode providenciar, a foto de Paul Simonon em prontidão de destruir seu baixo foi registrada instintivamente por Pennie Smith que estava localizada – pela providência roqueira – estrategicamente no palco.
Assim como a imagem de Elvis, a estampa de um dos melhores – quicá o melhor – álbum do The Clash é um exemplo máximo do espírito livre e rebelde do rock n’ roll. O próprio idealizador do resultado final da capa de London Calling assumiu ter buscado inspiração no álbum de Elvis para sua produção. A escolha dessa imagem para a capa foi um aceno ao espírito rebelde e livre do rock, uma conexão visual direta com o ícone Elvis Presley.
Rolling Stones e Motley Crüe: Glam Rock e a Inspiração Visual
Avançando para a interseção do glam rock e do hard rock, encontramos um par fascinante: Rolling Stones e Motley Crüe. Os Rolling Stones, com seu estilo glam rock avant-garde, influenciaram não apenas a música, mas também a estética visual do gênero. Já o Motley Crüe definiu o glam metal dos anos 80 com um primeiro disco que fez uma releitura de uma das capas icônicas dos Stones
Mick Jagger e os Rolling Stones faziam glam rock muito antes do estilo nascer. Sendo assim, nada mais natural que uma de suas capas inspirar um dos maiores clássico do metal glamouroso dos anos 80. O mundo do rock passava por uma verdadeira revolução no início daquela década e os Estados Unidos assistiam ao nascimento de duas vertentes distintas, mas que dominariam a música pesada nos próximos dez anos, o thrash metal e o glam metal.
Liderados pelo Mötley Crüe, o Glam Metal – ou Hard Rock Oitentista – deu seus passos iniciais para o que seria uma das gerações mais prolíficas e de grande qualidade musical na história do rock. Em 1982, sai “Too Fast For Love“, o primeiro álbum do Motley Crüe que vinha estampado em uma versão oitentista e heavy metal da capa de “Sticky Fingers” dos Rolling Stones, uma das mais reconhecidas capas da história da música.
A imagem apresentada na obra dos ingleses dos Rolling Stones é o supra-sumo da arte roqueira. Extravagante, espirituosa, devassa e auto-indulgente, a ideia nasceu da mente de Andy Warholl e foi concebida com um zíper real no produto final, que quando era aberto, mostrava roupas de baixo estampadas com o logo de Warholl.
Ao contrário do que muitos pensam, o modelo da capa não é Mick Jagger, mas algum transeunte da Factory comandada pelo próprio Andy Warholl. Mesmo sendo menos devassa que a original, a capa de “Too Fast For Love” chamava a atenção e atraía olhares para o lançamento daquele novo grupo. O relativo recato em comparação à estampa de “Sticky Fingers” pode ser justificado pelo momento de censura nas terra do Tio Sam.
Mesmo assim, a versão “mötleyniana” esbanja machismo e atitude e, ao contrário da versão “stoneana”, o modelo na capa é o vocalista Vince Neil. Essa conexão visual entre os dois álbuns não apenas homenageia os Rolling Stones, mas também ilustra a evolução do rock ao longo das décadas.
Kiss e Manowar: Heróis do Rock Ilustrados por Ken Kelly
O terceiro par de capas gêmeas nos leva a uma colaboração artística única entre Kiss e Manowar. Um caso onde há uma inegável similaridade, afinal, além das capas se parecerem em demasia, foram ilustradas pelo mesmo artista, a saber, Ken Kelly.
Além de um dos maiores ícones do rock, o Kiss pode ser considerado uma máquina de fazer dinheiro devido ao marketing empregado pela banda.Tanto que em 1976 eles se tornaram personagens de histórias em quadrinhos na capa de “Destroyer”, um dos maiores álbuns de rock de todos os tempos.
Dennis Woloch já se dedicava ao trabalho gráfico dos quatro mascarados desde seu primeiro lançamento e buscava algo novo para ilustrar o próximo álbum, cujo título já era conhecido. Foi quando, no horário de seu almoço, se deparou com a capa de uma revista em quadrinhos do gênero terror chamada Creepy. O artista responsável por aquela obra que prendeu Woloch era Ken Kelly, que realizou um trabalho memorável ao transformar Gene, Paul, Ace e Peter em super-heróis.
Doze anos se passaram e Ken Kelly teve uma nova missão: transformar os músicos da banda Manowar em personagens de RPG, nos moldes medievais. Numa primeira olhadela na capa de “Fighting The World”, quinto álbum do Manowar, temos impressão de encarar a capa de “Destroyer” adicionada com um pouco mais de testosterona.
Após este trabalho, Ken Kelly foi o responsável pela arte de capa de vários dos vindouros álbuns dos Reis do Metal (como se auto-denominam os membros do Manowar). Essas capas não apenas destacam a habilidade de Ken Kelly como artista, mas também a conexão temática entre as duas bandas no universo do rock.
The Beatles e Frank Zappa: Paródia e Crítica Social
Por fim, exploramos a relação entre The Beatles e Frank Zappa. O álbum “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band” dos Beatles é uma obra-prima visual e musical, repleta de enigmas e referências culturais. Frank Zappa, conhecido por sua abordagem crítica e satírica, escolheu parodiar esta capa no álbum “We’re Only in It for the Money” com sua banda, The Mothers of Invention.
Esta é uma situação diferenciada das demais. A influências dos quatro rapazes de Liverpool transcende as barreiras do rock e podem ser percebidas em doses homeopáticas em todo o mundo da música. Porém, Frank Zappa e seu Mothers of Invention resolveram utilizar, em seu quarto álbum, uma paródia surrealista da capa da obra-prima “Sgt. Pepper’s Lonely Hearts Club Band”.
A capa deste disco é uma das mais enigmáticas da discografia dos Beatles, ao lado da que estampa o álbum Abbey Road, trazendo vestígios que embasam a teoria de que Paul McCartney teria morrido e substituído por um sósia. Do lado de cá do Atlântico, Frank Zappa sempre foi um contestador dos padrões pré-estabelecidos e não se cansava de escarnecer o movimento flower power.
Em We’re Only For The Money, Zappa e seus companheiros criticam toda a estética hippie e modus vivendi americano nos anos 60, mas com o claro objetivo de atingir o pensamento crítico da juventude da época.
Creio que não existia melhor maneira de começar uma destruição de conceitos do que zombando deles, e foi o que Zappa realizou com todo o seu sarcasmo. Originalmente, a capa do antológico disco dos Beatles seria estampado por uma caixa de presentes, mas Peter Blake acabou por criar um belíssimo exemplar de pop art utilizando recortes de cartolina que traziam diversas personalidades da humanidade.
Este foi o primeiro lançamento em capa dupla dos Beatles e a imagem na versão americana idealizada por Zappa, foi concebida por Jerry Schatzberg. Após esta bem-humorada exploração da obra dos Beatles diversas paródias de suas capas se espalharam e creio ser a estampa de “Abbey Road” a mais vitimizada por tais reproduções.
Conclusão:
Ao explorar estas capas gêmeas de discos de vinil, mergulhamos em uma jornada que transcende a mera estética. Elas são testemunhos da interconexão cultural e da influência mútua entre diferentes eras e estilos no mundo do rock.
Cada par de capas é uma cápsula do tempo, capturando a essência de sua época e prestando homenagem aos gigantes sobre cujos ombros os artistas seguintes se ergueram. Essas imagens são mais do que simples embalagens; são reflexos da alma da música, contando histórias de rebelião, inovação e a eterna busca pela expressão artística.
Elas nos lembram que, no universo do vinil, cada disco é uma peça de história, um diálogo entre o passado e o presente, tecendo a rica tapeçaria do legado do rock.
Leia Mais:
- Reflexões de um colecionador sobre as capas dos discos.
- Frank Sinatra e Elvis Presley: O Encontro que Uniu Gerações
- Rolling Stones e a Simpatia Pelo Demônio
- O Kiss e as Mistificações da Turnê Brasileira de 1983
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